domingo, 13 de junho de 2010

A reforma do processo civil

O Estado de S.Paulo

Depois de seis meses de discussões, a comissão de juristas nomeada pelo Senado para preparar o projeto de reforma do Código de Processo Civil (CPC) concluiu seu trabalho. A comissão estabeleceu 80 diretrizes, submeteu-as a audiências públicas, que foram realizadas em oito capitais, e criou um sistema para colher sugestões dos setores interessados pela internet. Foram recebidas cerca de mil propostas, das quais apenas 150 foram aproveitadas. Houve grande quantidade de propostas repetitivas.

O projeto foi redigido com rapidez, mas agora terá uma longa trajetória pela frente. Ele será encaminhado à Comissão Especial integrada por 11 senadores. Depois passará pela Comissão de Constituição e Justiça. Em seguida, será submetido ao plenário. Se for aprovado, será enviado para a Câmara dos Deputados. E, se sofrer emendas, retornará ao Senado. Como o texto tem 997 artigos de grande complexidade técnica, os debates nas comissões e nos plenários devem ser longos. Além disso, o Congresso trabalhará em período de meio expediente durante a campanha eleitoral, o que indica que o projeto não será convertido em lei antes de 2011, embora a ideia original fosse aprová-lo ainda este ano.

Considerado excessivamente formalista, o CPC em vigor foi editado em 1973, quando eram outras as condições sociais, econômicas e políticas do País. Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), tramitam nos tribunais mais de 70 milhões de processos, dos quais 40 milhões se encontram em fase de execução. Por causa do alto número de recursos previstos pela legislação vigente, tão cedo essas ações não serão encerradas. Há processos protocolados há 20 anos que ainda não foram julgados em caráter definitivo, apesar da campanha que o CNJ deflagrou no ano passado para estimular a Justiça a julgar até dezembro último todas as ações distribuídas antes de 2005.

O objetivo da reforma do CPC é reduzir o tempo médio do julgamento dos processos para até dois anos. Nos chamados litígios de massa, como os que discutem o valor da correção monetária aplicada às cadernetas de poupança durante os planos econômicos, cobrança de assinatura básica de telefonia e direito do consumidor, a ideia é reduzir a um ano o tempo entre o ajuizamento e o julgamento da ação. Para alcançar esse objetivo, o projeto de reforma do CPC limita o número de recursos e prevê sanções aos advogados que impetrarem medidas protelatórias. Ele também acaba com o efeito suspensivo automático em caso de apelação de uma sentença de primeira instância. Com isso, a decisão teria de ser cumprida, mesmo que a parte derrotada recorresse à segunda instância.

Outra inovação, que segue a mesma lógica do princípio da repercussão geral introduzido no STF com base na Emenda Constitucional n.º 45, é o "incidente de coletivização". Destinado a evitar a proliferação de ações sobre um mesmo tema, esse instituto jurídico permitirá que os julgamentos de ações semelhantes sejam suspensos, nas instâncias inferiores, até que o STJ avalie a questão. A decisão desta Corte servirá de orientação para os juízes de primeira instância, evitando a subida dos processos para as instâncias superiores. Se essa medida estivesse em vigor na época dos pacotes econômicos, milhares de ações que congestionam os tribunais superiores, exigindo o ressarcimento dos prejuízos causados por expurgos nos índices da inflação, não teriam chegado a Brasília. Um caso seria julgado e serviria de parâmetro para os demais.

Em círculos governamentais a reforma do CPC é vista como uma iniciativa capaz de levar à redução do chamado "custo Brasil". Em certos meios forenses, contudo, o entendimento é que a comissão valorizou inovações jurídicas determinadas apenas por razões econômicas e que a redução do número de recursos compromete o direito constitucional à ampla defesa. Nas comissões técnicas e no plenário da Câmara e do Senado, os parlamentares terão oportunidade de evitar que a necessária modernização do CPC ponha em risco as garantias fundamentais.



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