segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012
JF reconhece inconstitucionalidade do Funrural
A juíza Federal substituta Elisângela Simon Caureo, da 2ª vara Tributária de Porto Alegre/RS, julgou parcialmente procedente a ação proposta pela FARSUL contra a União – Fazenda Nacional ao reconhecer a inconstitucionalidade e inexigibilidade da contribuição previdenciária Funrural, paga pelos empregadores rurais pessoa física representados pela Federação.
Na sentença, além de declarar que não sejam recolhidas as contribuições previstas nos artigos 25, I e II, da lei 8.212/91, também condenou a União a repetir os valores eventualmente recolhidos indevidamente, nos termos da fundamentação.
O advogado Nestor Fernando Hein, diretor do Departamento Jurídico da FARSUL, esclarece que, após o trânsito em julgado da decisão, todos os empregadores rurais pessoa física da categoria profissional abrangida pela FARSUL, além de não mais se submeterem à retenção do tributo, poderão postular a devolução dos valores recolhidos a partir de 8/6/05, devidamente corrigidos nos termos definidos na sentença.
A sentença não interfere na contribuição ao SENAR, alíquota de 0,2%, cujo recolhimento continua a ser efetuado através da Guia da Previdência Social e arrecadado pela Receita Federal como contribuição devida a terceiros.
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AÇÃO ORDINÁRIA (PROCEDIMENTO COMUM ORDINÁRIO) Nº 5010414-14.2010.404.7100/RS
AUTOR : FEDERAÇÃO DA AGRICULTURA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
RÉU : UNIÃO - FAZENDA NACIONAL
SENTENÇA
I - Relatório
Trata-se de ação, pelo rito ordinário, em que a parte autora, federação sindical, postula a declaração de inconstitucionalidade da contribuição incidente sobre a comercialização da produção rural, prevista no art. 25, I e II, da Lei n.º 8.212/91 (FUNRURAL), devida por seus sindicalizados, pessoas físicas, que ostentam a condição de empregadores rurais. Em síntese, sustentou a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei 8.540/92, que deu nova redação aos artigos 12, V e VII, 25, I e II, e 30, IV, da Lei 8.212/91 (com a redação atualizada até a Lei 9.528/97). Pleiteia, em sede de antecipação da tutela, para que seja facultado a seus sindicalizados efetuarem o depósito judicial dos valores referentes à referida contribuição.
Inicialmente, determinou-se a adequação do valor da causa (evento n.º 3). Em resposta, a parte autora retificou o valor inicial, asseverando que 'a presente ação não pretende obter a suspensão da exigibilidade da contribuição previdenciária incidente sobre a comercialização da produção rural de todos os produtores e empregadores rurais pessoa física do Estado do Rio Grande do Sul, mas somente daqueles que optarem por efetuar o depósito judicial do tributo'. Apresentou, na oportunidade, comprovante de recolhimento das custas complementares (evento n. 6).
O pedido de antecipação de tutela foi indeferido (evento n.º 8). Contra esta decisão, a parte autora interpôs agravo de instrumento, tendo o relator deferido o efeito suspensivo (evento n.º 18). Todavia, no mérito, o recurso foi desprovido (evento n.º 27).
A parte autora apresentou relação dos empregadores/produtores rurais que representa (evento n.º 19).
Citada, a União apresentou contestação (evento n.º 22). Arguiu, a título preliminar, a ausência de documentos indispensáveis, consistentes na comprovação de que dos produtores rurais que a federação representa ostentam a condição de empregadores rurais. Acaso afastada a preliminar, requereu a explicitação da exigência, no decisum, para efeito de execução da sentença.
Ainda em matéria preliminar, a impossibilidade de se veicular matéria tributária em ação coletiva. Suscitou, como prefacial de mérito, a ocorrência da prescrição quinquenal.
No mérito, sustentou a Fazenda a legalidade da contribuição previdenciária do empregador rural, já que está devidamente respaldada na Constituição Federal. Ressaltou que a contribuição questionada está prevista no art. 25 da Lei nº 8.212/91, com redação atual dada pela Lei nº 10.256/01, e incide sobre a receita bruta da comercialização da produção rural, ou seja, sobre o faturamento, conforme a autorização expressa da Carta Magna.
Os produtores rurais Carlos Roberto Simm e Jairo Faccio requereram seu ingresso no feito (evento n.º 21 e 25, respectivamente).
A habilitação dos referidos produtores foi indeferida, ocasião em que foi determinado o levantamento dos depósitos vinculados ao feito (evento n.º 28).
Vieram os autos conclusos para sentença.
II - Fundamentação
1. Preliminares:
1.1. Da legitimidade da federação sindical para questionar a contribuição prevista no art. 25 da Lei nº. 8.212/91 (FUNRURAL) e dos documentos indispensáveis
Inicialmente, saliento que tanto os sindicatos como as associações têm legitimidade ativa para representar seus sindicalizados e associados, questão em relação a qual não paira qualquer dúvida. Essa legitimidade advém, em suas linhas basilares, da Constituição da República, de acordo com os artigos que transcrevo abaixo:
Art. 5º (...)
LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:
(...)
b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados;
Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:
I - a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical;
II - é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um Município;
III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;
(...)
V - ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato;
Na linha constitucional, é a redação do art. 3º da Lei n.º 8.073/90:
Art. 3º As entidades sindicais poderão atuar como substitutos processuais dos integrantes da categoria.
As categorias estão definidas no art. 511 da CLT, que dispõe:
'É lícita a associação para fins de estudo, defesa e coordenação dos seus interesses econômicos ou profissionais de todos os que, como empregadores, empregados, agentes ou trabalhadores autônomos, ou profissionais liberais, exerçam, respectivamente, a mesma atividade ou profissões similares ou conexas.'
Note-se que o STF já consolidou o entendimento de que o sindicato representa não apenas seus filiados ou sindicalizados, mas toda a categoria a que está vinculado. Nos termos do citado art. 8º, III da CF, já mencionado, o sindicato é expressamente autorizado a atuar como substituto processual da categoria profissional, possuindo legitimação extraordinária (art. 6º do CPC) para a defesa judicial dos direito e interesses coletivos ou individuais da categoria, sendo desnecessária a autorização expressa dos sindicalizados.
PROCESSO CIVIL. SINDICATO. ART. 8º, III DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEGITIMIDADE. SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL. DEFESA DE DIREITOS E INTERESSES COLETIVOS OU INDIVIDUAIS. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. O artigo 8º, III da Constituição Federal estabelece a legitimidade extraordinária dos sindicatos para defender em juízo os direitos e interesses coletivos ou individuais dos integrantes da categoria que representam. Essa legitimidade extraordinária é ampla, abrangendo a liquidação e a execução dos créditos reconhecidos aos trabalhadores. Por se tratar de típica hipótese de substituição processual, é desnecessária qualquer autorização dos substituídos. Recurso conhecido e provido.
(RE 210029, Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Tribunal Pleno, julgado em 12/06/2006, DJe-082 DIVULG 16-08-2007 PUBLIC 17-08-2007 DJ 17-08-2007 PP-00025 EMENT VOL-02285-05 PP-00900)
Com isso, fica evidente que a entidade sindical ingressa em juízo em defesa de seus sindicalizados, sem a necessidade de sequer nominá-los, o que torna irrelevante qualquer outra circunstância pessoal relativa aquele que se beneficiará da demanda coletiva.
De consequência, afigura-se despiciendo, além de impraticável, exigir, como quer a ré, que a federação sindical apresente 'Notas Fiscais emitidas pelo produtor rural', 'folhas de pagamento emitidas em consonância com as informações mensais detalhadas na Relação Anual de Informações Sociais - RAIS' ou mesmo 'cópias dos recibos de entrega e relatórios detalhados da GFIP' em relação a todos os empregadores rurais pessoas físicas substituídos.
Impende ressaltar que os elementos probatórios aptos a demonstrar que o substituído faz jus ao direito reconhecido no título executivo deverão ser exigidos em sede própria, por ocasião da execução individual do julgado.
Por essas razões, rejeito a preliminar arguida.
1.2. Da impossibilidade de ajuizamento de ação coletiva para discutir matéria tributária
Invocou a parte ré, por ocasião da contestação, a aplicação do art. 1º, parágrafo único, da Lei n.º 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública), que inibe a utilização da ação civil pública para veicular pretensões relativas a tributos, ao argumento de que não haveria distinção precisa entre ação civil pública e ação coletiva.
Vale a transcrição do dispositivo legal:
Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados: (Redação dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994)
l - ao meio-ambiente;
ll - ao consumidor;
III - a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;
IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo. (Incluído pela Lei nº 8.078 de 1990)
V - por infração da ordem econômica e da economia popular; (Redação dada pela Medida provisória nº 2.180-35, de 2001)
VI - à ordem urbanística. (Incluído pela Medida provisória nº 2.180-35, de 2001)
Parágrafo único. Não será cabível ação civil pública para veicular pretensões que envolvam tributos, contribuições previdenciárias, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS ou outros fundos de natureza institucional cujos beneficiários podem ser individualmente determinados. (Incluído pela Medida provisória nº 2.180-35, de 2001)
O mencionado enunciado normativo não se aplica, entretanto, ao caso em exame. Isso porque não se está a tratar de direitos ou interesses difusos ou coletivos, na precisa definição do art. 81, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, os quais, a rigor, são veiculados por meio de ação civil pública.
O direito ora em exame tem natureza individual homogênea, decorrente origem comum (art. 81, parágrafo único, III, do CDC) e cujos beneficiários podem ser individualmente determinados, razão pela qual não há falar em impossibilidade em ajuizar-se a ação ora em análise.
É de notar que os precedentes invocados pela Fazenda Nacional se referem a pretensões relativas a tributos veiculadas em ação civil pública, o que não é o caso dos autos, em que se está a tratar de ação ordinária, de natureza coletiva, proposta por entidade sindical em defesa de seus sindicalizados.
Por essas razões, afasto a preliminar arguida.
2. Prejudicial de mérito: prescrição/Decadência:
O prazo para ajuizar a ação visando à repetição do indébito e/ou compensação é, atualmente, de cinco anos, em decorrência da aplicação da Lei Complementar nº 118/2005, art. 3º, vigente a partir de 09 de junho de 2005.
O Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial, entendeu que o art. 4º da LC nº 118/2005 que determina a aplicação retroativa do art. 3º, alcançando fatos passados, ofende o princípio constitucional da autonomia e independência dos poderes (CF, art. 2º) e o da garantia do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada (CF, art. 5º, XXXVI).
A questão foi submetida também ao Supremo Tribunal Federal, que, dada sua relevância, reconheceu a existência de Repercussão Geral, de acordo com a sistemática prevista no art. 543-B do Código de Processo Civil, no RE 561.908/RS:
TRIBUTO - REPETIÇÃO DE INDÉBITO - LEI COMPLEMENTAR Nº 118/2005 - REPERCUSSÃO GERAL - ADMISSÃO. Surge com repercussão geral controvérsia sobre a inconstitucionalidade, declarada na origem, da expressão 'observado, quanto ao artigo 3º, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional', constante do artigo 4º, segunda parte, da Lei Complementar nº 118/2005.
(RE 561908 RG, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, julgado em 08/11/2007, DJe-157 DIVULG 06-12-2007 PUBLIC 07-12-2007 DJ 07-12-2007 PP-00016 EMENT VOL-02302-08 PP-01660 )
Ao julgar recentemente a controvérsia, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, na análise do RE 566.621/RS, rel. Min. Ellen Gracie, reconheceu a inconstitucionalidade do dispositivo, conforme constou do Informativo n.º 634:
'Prazo para repetição ou compensação de indébito tributário e art. 4º da LC 118/2005 - 5 É inconstitucional o art. 4º, segunda parte, da Lei Complementar 118/2005 ['Art. 3º Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1º do art. 150 da referida Lei. Art. 4º Esta Lei entra em vigor 120 (cento e vinte) dias após sua publicação, observado, quanto ao art. 3º, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional'; CTN: 'Art. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito: I - em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados']. Esse o consenso do Plenário que, em conclusão de julgamento, desproveu, por maioria, recurso extraordinário interposto de decisão que reputara inconstitucional o citado preceito - v. Informativo 585. Prevaleceu o voto proferido pela Min. Ellen Gracie, relatora, que, em suma, assentara a ofensa ao princípio da segurança jurídica - nos seus conteúdos de proteção da confiança e de acesso à Justiça, com suporte implícito e expresso nos artigos 1º e 5º, XXXV, da CF - e considerara válida a aplicação do novo prazo de 5 anos tão-somente às ações ajuizadas após o decurso da vacatio legis de 120 dias, ou seja, a partir de 9.6.2005. Os Ministros Celso de Mello e Luiz Fux, por sua vez, dissentiram apenas no tocante ao art. 3º da LC 118/2005 e afirmaram que ele seria aplicável aos próprios fatos (pagamento indevido) ocorridos após o término do período de vacatio legis. Vencidos os Ministros Marco Aurélio, Dias Toffoli, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes, que davam provimento ao recurso'.
Essa decisão ficou ementada nos seguintes termos:
DIREITO TRIBUTÁRIO - LEI INTERPRETATIVA - APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI COMPLEMENTAR Nº 118/2005 - DESCABIMENTO - VIOLAÇÃO À SEGURANÇA JURÍDICA - NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DA VACACIO LEGIS - APLICAÇÃO DO PRAZO REDUZIDO PARA REPETIÇÃO OU COMPENSAÇÃO DE INDÉBITOS AOS PROCESSOS AJUIZADOS A PARTIR DE 9 DE JUNHO DE 2005. Quando do advento da LC 118/05, estava consolidada a orientação da Primeira Seção do STJ no sentido de que, para os tributos sujeitos a lançamento por homologação, o prazo para repetição ou compensação de indébito era de 10 anos contados do seu fato gerador, tendo em conta a aplicação combinada dos arts. 150, § 4º, 156, VII, e 168, I, do CTN. A LC 118/05, embora tenha se auto-proclamado interpretativa, implicou inovação normativa, tendo reduzido o prazo de 10 anos contados do fato gerador para 5 anos contados do pagamento indevido. Lei supostamente interpretativa que, em verdade, inova no mundo jurídico deve ser considerada como lei nova. Inocorrência de violação à autonomia e independência dos Poderes, porquanto a lei expressamente interpretativa também se submete, como qualquer outra, ao controle judicial quanto à sua natureza, validade e aplicação. A aplicação retroativa de novo e reduzido prazo para a repetição ou compensação de indébito tributário estipulado por lei nova, fulminando, de imediato, pretensões deduzidas tempestivamente à luz do prazo então aplicável, bem como a aplicação imediata às pretensões pendentes de ajuizamento quando da publicação da lei, sem resguardo de nenhuma regra de transição, implicam ofensa ao princípio da segurança jurídica em seus conteúdos de proteção da confiança e de garantia do acesso à Justiça. Afastando-se as aplicações inconstitucionais e resguardando-se, no mais, a eficácia da norma, permite-se a aplicação do prazo reduzido relativamente às ações ajuizadas após a vacatio legis, conforme entendimento consolidado por esta Corte no enunciado 445 da Súmula do Tribunal. O prazo de vacatio legis de 120 dias permitiu aos contribuintes não apenas que tomassem ciência do novo prazo, mas também que ajuizassem as ações necessárias à tutela dos seus direitos. Inaplicabilidade do art. 2.028 do Código Civil, pois, não havendo lacuna na LC 118/08, que pretendeu a aplicação do novo prazo na maior extensão possível, descabida sua aplicação por analogia. Além disso, não se trata de lei geral, tampouco impede iniciativa legislativa em contrário. Reconhecida a inconstitucionalidade art. 4º, segunda parte, da LC 118/05, considerando-se válida a aplicação do novo prazo de 5 anos tão-somente às ações ajuizadas após o decurso da vacatio legis de 120 dias, ou seja, a partir de 9 de junho de 2005. Aplicação do art. 543-B, § 3º, do CPC aos recursos sobrestados. Recurso extraordinário desprovido. (RE 566621, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 04/08/2011, DJe-195 DIVULG 10-10-2011 PUBLIC 11-10-2011 EMENT VOL-02605-02 PP-00273)
Note-se, portanto, que o Pretório Excelso considerou válida a aplicação da prescrição quinquenal às ações ajuizadas a partir da vigência da LC n.º 118/2005. Assim, independentemente de os pagamentos indevidos terem ocorrido em prazo anterior à sua vigência, caso a ação tenha sido ajuizada a partir de 09 de junho de 2005, deve-se reconhecer a prescrição da pretensão em relação à restituição do indébito anterior aos 5 (cinco) anos que precedem o ajuizamento da ação.
Os indébitos questionados em ações ajuizadas anteriormente à vigência da LC 118/2005, por outro lado, regem-se pela regra anterior, não podendo superar dez anos.
No caso concreto, considerando que a ação foi ajuizada em 08/06/2010, encontra-se prescrita a pretensão em relação aos recolhimentos anteriores a 08/06/2005.
3. Mérito:
3.1. Contribuição do art. 25, I e II, da Lei n.º 8.212/91: empregador rural pessoa física com empregados
A discussão travada nos autos foi recentemente objeto de apreciação pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em recurso extraordinário, portanto, controle difuso, sem efeitos erga omnes, uma vez que não acionado o Senado para expedição de Resolução.
Assim, o Informativo n.º 573 resume o conteúdo da decisão:
'Em conclusão, o Tribunal deu provimento a recurso extraordinário para desobrigar os recorrentes da retenção e do recolhimento da contribuição social ou do seu recolhimento por sub-rogação sobre a 'receita bruta proveniente da comercialização da produção rural' de empregadores, pessoas naturais, fornecedores de bovinos para abate, declarando a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei 8.540/92, que deu nova redação aos artigos 12, V e VII, 25, I e II, e 30, IV, da Lei 8.212/91, com a redação atualizada até a Lei 9.528/97, até que legislação nova, arrimada na Emenda Constitucional 20/98, venha a instituir a contribuição. Na espécie, os recorrentes, empresas adquirentes de bovinos de produtores rurais, impugnavam acórdão do TRF da 1ª Região que, com base na referida legislação, reputara válida a incidência da citada contribuição. Sustentavam ofensa aos artigos 146, III; 154, I; e 195, I, e §§ 4º e 8º, da CF - v. Informativos 409 e 450. Entendeu-se ter havido bitributação, ofensa ao princípio da isonomia e criação de nova fonte de custeio sem lei complementar. Considerando as exceções à unicidade de incidência de contribuição previstas nos artigos 239 e 240 das Disposições Constitucionais Gerais, concluiu-se que se estaria exigindo do empregador rural, pessoa natural, a contribuição social sobre a folha de salários, como também, tendo em conta o faturamento, da COFINS, e sobre o valor comercializado de produtos rurais (Lei 8.212/91, art. 25), quando o produtor rural, sem empregados, que exerça atividades em regime de economia familiar, só contribui, por força do disposto no art. 195, § 8º, da CF, sobre o resultado da comercialização da produção. Além disso, reputou-se que a incidência da contribuição sobre a receita bruta proveniente da comercialização pelo empregador rural, pessoa natural, constituiria nova fonte de custeio criada sem observância do art. 195, § 4º, da CF, uma vez que referida base de cálculo difere do conceito de faturamento e do de receita. O relator, nesta assentada, apresentou petição da União no sentido de modular os efeitos da decisão, que foi rejeitada por maioria, ficando vencida, no ponto, a Min. Ellen Gracie. RE 363852/MG, rel. Min. Marco Aurélio, 3.2.2010. (RE-363852)'
O Supremo entendeu existir três fundamentos para que a cobrança fosse considerada inconstitucional: bitributação, ofensa ao princípio da isonomia e criação de nova fonte de custeio sem lei complementar.
Importa verificar os fundamentos da decisão e a sua extensão. Para isso, vejamos as disposições legais a respeito das contribuições previdenciárias e suas formas de arrecadação e recolhimento:
Art. 22. A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do disposto no art. 23, é de:
I - vinte por cento sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas a qualquer título, durante o mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos que lhe prestem serviços, destinadas a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador de serviços, nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa. (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 1999).
II - para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, sobre o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos: (Redação dada pela Lei nº 9.732, de 1998).
a) 1% (um por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado leve;
b) 2% (dois por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado médio;
c) 3% (três por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado grave.
III - vinte por cento sobre o total das remunerações pagas ou creditadas a qualquer título, no decorrer do mês, aos segurados contribuintes individuais que lhe prestem serviços; (Incluído pela Lei nº 9.876, de 1999).
IV - quinze por cento sobre o valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços, relativamente a serviços que lhe são prestados por cooperados por intermédio de cooperativas de trabalho. (Incluído pela Lei nº 9.876, de 1999).
(...)
Art. 22A. A contribuição devida pela agroindústria, definida, para os efeitos desta Lei, como sendo o produtor rural pessoa jurídica cuja atividade econômica seja a industrialização de produção própria ou de produção própria e adquirida de terceiros, incidente sobre o valor da receita bruta proveniente da comercialização da produção, em substituição às previstas nos incisos I e II do art. 22 desta Lei, é de: (Incluído pela Lei nº 10.256, de 2001).
I - dois vírgula cinco por cento destinados à Seguridade Social; (Incluído pela Lei nº 10.256, de 2001).
II - zero vírgula um por cento para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade para o trabalho decorrente dos riscos ambientais da atividade. (Incluído pela Lei nº 10.256, de 2001).
§ 1º (VETADO) (Incluído pela Lei nº 10.256, de 2001).
§ 2º O disposto neste artigo não se aplica às operações relativas à prestação de serviços a terceiros, cujas contribuições previdenciárias continuam sendo devidas na forma do art. 22 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 10.256, de 2001).
§ 3º Na hipótese do § 2o, a receita bruta correspondente aos serviços prestados a terceiros será excluída da base de cálculo da contribuição de que trata o caput. (Incluído pela Lei nº 10.256, de 2001).
§ 4º O disposto neste artigo não se aplica às sociedades cooperativas e às agroindústrias de piscicultura, carcinicultura, suinocultura e avicultura. (Incluído pela Lei nº 10.256, de 2001).
§ 5º O disposto no inciso I do art. 3o da Lei no 8.315, de 23 de dezembro de 1991, não se aplica ao empregador de que trata este artigo, que contribuirá com o adicional de zero vírgula vinte e cinco por cento da receita bruta proveniente da comercialização da produção, destinado ao Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR). (Incluído pela Lei nº 10.256, de 2001).
§ 6º Não se aplica o regime substitutivo de que trata este artigo à pessoa jurídica que, relativamente à atividade rural, se dedique apenas ao florestamento e reflorestamento como fonte de matéria-prima para industrialização própria mediante a utilização de processo industrial que modifique a natureza química da madeira ou a transforme em pasta celulósica. (Incluído pela Lei nº 10.684, de 2003).
§ 7º Aplica-se o disposto no § 6o ainda que a pessoa jurídica comercialize resíduos vegetais ou sobras ou partes da produção, desde que a receita bruta decorrente dessa comercialização represente menos de um por cento de sua receita bruta proveniente da comercialização da produção. (Incluído pela Lei nº 10.684, de 2003).
Art. 22B. As contribuições de que tratam os incisos I e II do art. 22 desta Lei são substituídas, em relação à remuneração paga, devida ou creditada ao trabalhador rural contratado pelo consórcio simplificado de produtores rurais de que trata o art. 25A, pela contribuição dos respectivos produtores rurais, calculada na forma do art. 25 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 10.256, de 2001).
Art. 23. As contribuições a cargo da empresa provenientes do faturamento e do lucro, destinadas à Seguridade Social, além do disposto no art. 22, são calculadas mediante a aplicação das seguintes alíquotas: (COFINS e CSLL)
I - 2% (dois por cento) sobre sua receita bruta, estabelecida segundo o disposto no § 1º do art. 1º do Decreto-lei nº 1.940, de 25 de maio de 1982, com a redação dada pelo art. 22, do Decreto-lei nº 2.397, de 21 de dezembro de 1987, e alterações posteriores; 9
II - 10% (dez por cento) sobre o lucro líquido do período-base, antes da provisão para o Imposto de Renda, ajustado na forma do art. 2º da Lei nº 8.034, de 12 de abril de 1990. 10
§ 1º No caso das instituições citadas no § 1º do art. 22 desta Lei, a alíquota da contribuição prevista no inciso II é de 15% (quinze por cento). 11
§ 2º O disposto neste artigo não se aplica às pessoas de que trata o art. 25.
Art. 25. A contribuição do empregador rural pessoa física, em substituição à contribuição de que tratam os incisos I e II do art. 22, e a do segurado especial, referidos, respectivamente, na alínea a do inciso V e no inciso VII do art. 12 desta Lei, destinada à Seguridade Social, é de: (Redação dada pela Lei nº 10.256, de 2001).
I - 2% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção; (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 10.12.97).
II - 0,1% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção para financiamento das prestações por acidente do trabalho. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 10.12.97).
§ 1º O segurado especial de que trata este artigo, além da contribuição obrigatória referida no caput, poderá contribuir, facultativamente, na forma do art. 21 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 8.540, de 22.12.92)
§ 2º A pessoa física de que trata a alínea 'a' do inciso V do art. 12 contribui, também, obrigatoriamente, na forma do art. 21 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 8.540, de 22.12.92)
§ 3º Integram a produção, para os efeitos deste artigo, os produtos de origem animal ou vegetal, em estado natural ou submetidos a processos de beneficiamento ou industrialização rudimentar, assim compreendidos, entre outros, os processos de lavagem, limpeza, descaroçamento, pilagem, descascamento, lenhamento, pasteurização, resfriamento, secagem, fermentação, embalagem, cristalização, fundição, carvoejamento, cozimento, destilação, moagem, torrefação, bem como os subprodutos e os resíduos obtidos através desses processos. (Parágrafo acrescentado pela Lei n º 8.540, de 22.12.92)
(...)
§ 9º (VETADO) (Incluído pela Lei nº 10.256, de 2001).
§ 10. Integra a receita bruta de que trata este artigo, além dos valores decorrentes da comercialização da produção relativa aos produtos a que se refere o § 3o deste artigo, a receita proveniente: (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008).
I - da comercialização da produção obtida em razão de contrato de parceria ou meação de parte do imóvel rural; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008).
II - da comercialização de artigos de artesanato de que trata o inciso VII do § 10 do art. 12 desta Lei; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008).
III - de serviços prestados, de equipamentos utilizados e de produtos comercializados no imóvel rural, desde que em atividades turística e de entretenimento desenvolvidas no próprio imóvel, inclusive hospedagem, alimentação, recepção, recreação e atividades pedagógicas, bem como taxa de visitação e serviços especiais; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008).
IV - do valor de mercado da produção rural dada em pagamento ou que tiver sido trocada por outra, qualquer que seja o motivo ou finalidade; e (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008).
V - de atividade artística de que trata o inciso VIII do § 10 do art. 12 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008).
§ 11. Considera-se processo de beneficiamento ou industrialização artesanal aquele realizado diretamente pelo próprio produtor rural pessoa física, desde que não esteja sujeito à incidência do Imposto Sobre Produtos Industrializados - IPI. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008).
(...)
Art. 30. A arrecadação e o recolhimento das contribuições ou de outras importâncias devidas à Seguridade Social obedecem às seguintes normas: (Redação dada pela Lei n° 8.620, de 5.1.93)
I - a empresa é obrigada a:
a) arrecadar as contribuições dos segurados empregados e trabalhadores avulsos a seu serviço, descontando-as da respectiva remuneração; (contribuição do segurado)
b) recolher os valores arrecadados na forma da alínea a deste inciso, a contribuição a que se refere o inciso IV do art. 22 desta Lei, assim como as contribuições a seu cargo incidentes sobre as remunerações pagas, devidas ou creditadas, a qualquer título, aos segurados empregados, trabalhadores avulsos e contribuintes individuais a seu serviço até o dia 20 (vinte) do mês subsequente ao da competência; (Redação dada pela Lei nº 11.933, de 2009). (Produção de efeitos). (recolhimento da contribuição do segurado e da contribuição sobre folha de pagamento e outros valores pagos)
c) recolher as contribuições de que tratam os incisos I e II do art. 23, na forma e prazos definidos pela legislação tributária federal vigente;
III - a empresa adquirente, consumidora ou consignatária ou a cooperativa são obrigadas a recolher a contribuição de que trata o art. 25 até o dia 20 (vinte) do mês subsequente ao da operação de venda ou consignação da produção, independentemente de essas operações terem sido realizadas diretamente com o produtor ou com intermediário pessoa física, na forma estabelecida em regulamento; (Redação dada pela Lei nº 11.933, de 2009). (Produção de efeitos).
IV - a empresa adquirente, consumidora ou consignatária ou a cooperativa ficam sub-rogadas nas obrigações da pessoa física de que trata a alínea 'a' do inciso V do art. 12 e do segurado especial pelo cumprimento das obrigações do art. 25 desta Lei, independentemente de as operações de venda ou consignação terem sido realizadas diretamente com o produtor ou com intermediário pessoa física, exceto no caso do inciso X deste artigo, na forma estabelecida em regulamento; (Redação dada pela Lei 9.528, de 10.12.97)
No recurso extraordinário nº. 363.852/MG, os recorrentes eram adquirentes de bovinos de produtores rurais, pessoas naturais. A sua situação jurídica importava na condição de sub-rogados nas obrigações da pessoa física de que trata a alínea 'a' do inciso V do art. 12 e do segurado especial pelo cumprimento das obrigações do art. 25 da Lei 8.212/91, 'exceto no caso do inciso X deste artigo'. A exceção diz respeito à comercialização direta pelo produtor rural, pessoa natural, com o exterior ou no varejo, para o consumidor.
Com isso, o STF, no referido RE, fixou a legitimidade da empresa adquirente da produção rural para requerer a declaração de inexigibilidade do tributo, fundamento legal no art. 30, IV, da Lei 8.212/91.
No RE nº. 363.852/MG, o Min. Marco Aurélio fundamentou a sua decisão dizendo que o art. 195, I, não dá substrato constitucional à exigência do art. 25, I e II, da Lei 8.212/91, nos termos do voto:
'Já aqui surge duplicidade contrária à Carta da República, no que, conforme o artigo 25, incisos I e II, da Lei n.º 8.212, de 24 de julho de 1991, o produtor rural passou a estar compelido a duplo recolhimento, com a mesma destinação, ou seja, o financiamento da seguridade social - recolhe, a partir do disposto no artigo 195, inciso I, alínea 'b', a COFINS e a contribuição prevista no referido artigo 25. Vale frisar que, no artigo 195, tem-se contemplada situação única em que o produtor rural contribui para a seguridade social mediante a aplicação de alíquota sobre o resultado de comercialização da produção, ante o disposto no § 8º do citado artigo 195 - a revelar que, em se tratando de produtor, parceiro, meeiro e arrendatários rurais e pescador artesanal bem como dos respectivos cônjuges que exerçam atividades em regime de economia familiar, sem empregados permanentes, dá-se a contribuição para a seguridade social por meio de aplicação de alíquota sobre o resultado da comercialização da produção. A razão do preceito é única: não se ter, quanto aos nele referidos, a base para a contribuição estabelecida na alínea 'a' do inciso I do artigo 195 da Carta, isto é, a folha de salários.'
O voto examinado utilizou-se da argumentação expendida na Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 1.103-1/DF, em se analisou o § 2º do art. 25 da Lei 8.870/94:
'Então, o produtor rural, pessoa natural fica compelido a satisfazer, de um lado, a contribuição sobre a folha de salários e, de outro, a COFINS, não havendo lugar para ter-se novo ônus, relativamente ao financiamento da seguridade social, isso a partir de valor alusivo à venda de bovinos. Cumpre ter presente, até mesmo, a regra do inciso II do artigo 150 da Constituição Federal, no que veda instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente.
(...)
'Assentou o Plenário que o § 2º do artigo 25 da Lei n.º 8.870/94 fulminado ensejara fonte de custeio sem observância do § 4º do artigo 195 da Constituição Federal, ou seja, sem a vinda à balha de lei complementar. O enfoque serve, sob o ângulo da exigência desta última, no tocante à disposição do artigo 25 da lei n.º 8.212/91. É que, mediante lei ordinária, versou-se a incidência da contribuição sobre a proveniente da comercialização pelo empregador rural, pessoa natural. Ora, como salientado no artigo de Hugo de Brito machado e Hugo de Brito Machado Segundo, houvesse confusão, houvesse sinonímia entre o faturamento e o resultado da comercialização da produção, não haveria razão para a norma do § 8º do artigo 195 da Constituição Federal relativa ao produtor que não conta com empregados e exerça atividades em regime de economia familiar. Já estava ele alcançado pela previsão imediatamente anterior - do inciso i do artigo 195 da Constituição. Também sob esse prisma, procede a irresignação, entendendo-se que comercialização da produção é algo diverso de faturamento e este não se confunde com receita, tanto assim que a Emenda Constitucional n.º 20/98 inseriu, ao lado do vocábulo 'faturamento', no inciso I do artigo 195, o vocábulo 'receita'. Então, não há como deixar de assentar que a nova fonte deveria estar estabelecida em lei complementar. O mesmo enfoque serve a rechaçar a óptica daqueles que vislumbram, no artigo 25, incisos I e II, da Lei n.º 8.212/91, a majoração da alíquota alusiva à citada contribuição que está prevista na Lei Complementar n.º 70/91.'
'Ante esses aspectos, conheço e provejo o recurso interposto para desobrigar os recorrentes da retenção e do recolhimento da contribuição social ou do seu recolhimento por subrrogação sobre a 'receita bruta proveniente da comercialização da produção rural' de empregadores, pessoas naturais, fornecedores de bovinos para abate, declarando a inconstitucionalidade do artigo 1º da lei n.º 8.540/92, que deu nova redação aos artigos 12, incisos V e VII, 25, incisos I e II, e 30, inciso IV, da lei n.º 8.212/91, com redação atualizada até a Lei n.º 9.528/97, até que legislação nova, arrimada na emenda Constitucional n.º 20/98, venha a instituir a contribuição, tudo na forma do pedido inicial, invertidos os ônus da sucumbência.
A decisão do STF apóia-se sobre três premissas. A primeira, diz que há bitributação, pois o empregador rural pessoa física é contribuinte da COFINS, tributo incidente sobre a mesma base de cálculo. A segunda entende que 'comercialização da produção rural' e 'faturamento' não se confundem. A terceira, baseia-se na 'inevitável' contradição entre o disposto no § 8º do art. 195 e a exigência da contribuição com fundamento no art. 195, I, b. Primo, de acordo com a LC 70/91 e o Dec. 3000, RIR, o empregador rural pessoa física não é contribuinte da Cofins, pois não é equiparado à pessoa jurídica pela legislação do imposto de renda. In verbis:
Art. 1° Sem prejuízo da cobrança das contribuições para o Programa de Integração Social (PIS) e para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep), fica instituída contribuição social para financiamento da Seguridade Social, nos termos do inciso I do art. 195 da Constituição Federal, devida pelas pessoas jurídicas inclusive as a elas equiparadas pela legislação do imposto de renda, destinadas exclusivamente às despesas com atividades-fins das áreas de saúde, previdência e assistência social.
Do sítio da Receita Federal:
A pessoa física equipara-se a pessoa jurídica quando:
a) em nome individual, explore, habitual e profissionalmente, qualquer atividade econômica de natureza civil ou comercial, com o fim especulativo de lucro, mediante venda a terceiro de bens ou serviços, quer se encontrem, ou não, regularmente inscritas no órgão do Registro de Comércio ou Registro Civil, exceto quanto às profissões de que trata o art. 150, § 2º, do Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999 - Regulamento do Imposto sobre a Renda - RIR;
b) promova a incorporação de prédios em condomínio ou loteamento de terrenos.
(Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999 - Regulamento do Imposto sobre a Renda - RIR, art. 150, incisos II e III)
O RIR, Dec. 3000/99, esclarece quais pessoas físicas são equiparadas à pessoa jurídica para fins de incidência do imposto de renda, in verbis:
Art. 150. As empresas individuais, para os efeitos do imposto de renda, são equiparadas às pessoas jurídicas (Decreto-Lei nº 1.706, de 23 de outubro de 1979, art. 2º).
§ 1º São empresas individuais:
I - as firmas individuais (Lei nº 4.506, de 1964, art. 41, § 1º, alínea 'a');
II - as pessoas físicas que, em nome individual, explorem, habitual e profissionalmente, qualquer atividade econômica de natureza civil ou comercial, com o fim especulativo de lucro, mediante venda a terceiros de bens ou serviços (Lei nº 4.506, de 1964, art. 41, § 1º, alínea 'b');
III - as pessoas físicas que promoverem a incorporação de prédios em condomínio ou loteamento de terrenos, nos termos da Seção II deste Capítulo (Decreto-Lei nº 1.381, de 23 de dezembro de 1974, arts. 1º e 3º, inciso III, e Decreto-Lei nº 1.510, de 27 de dezembro de 1976, art. 10, inciso I).
§ 2º O disposto no inciso II do parágrafo anterior não se aplica às pessoas físicas que, individualmente, exerçam as profissões ou explorem as atividades de:
I - médico, engenheiro, advogado, dentista, veterinário, professor, economista, contador, jornalista, pintor, escritor, escultor e de outras que lhes possam ser assemelhadas (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 6º, alínea 'a', e Lei nº 4.480, de 14 de novembro de 1964, art. 3º);
II - profissões, ocupações e prestação de serviços não comerciais (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 6º, alínea 'b');
III - agentes, representantes e outras pessoas sem vínculo empregatício que, tomando parte em atos de comércio, não os pratiquem, todavia, por conta própria (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 6º, alínea 'c');
IV - serventuários da justiça, como tabeliães, notários, oficiais públicos e outros (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 6º, alínea 'd');
V - corretores, leiloeiros e despachantes, seus prepostos e adjuntos (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 6º, alínea 'e');
VI - exploração individual de contratos de empreitada unicamente de lavor, qualquer que seja a natureza, quer se trate de trabalhos arquitetônicos, topográficos, terraplenagem, construções de alvenaria e outras congêneres, quer de serviços de utilidade pública, tanto de estudos como de construções (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 6º, alínea 'f');
VII - exploração de obras artísticas, didáticas, científicas, urbanísticas, projetos técnicos de construção, instalações ou equipamentos, salvo quando não explorados diretamente pelo autor ou criador do bem ou da obra (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 6º, alínea 'g').
Embora o empregador rural pessoa física não recolha COFINS, há, efetivamente a superposições de tributos sobre base de cálculo idêntica, fenômeno vedado pela Constituição Federal no seu art. 154, I. Isso, contudo, apenas se considerarmos que o inciso I, b, do art. 195 não dá substrato constitucional à exação ora impugnada.
Nessa linha, vale dizer que, quando do julgamento da constitucionalidade da lei n. 9.718, fixou-se o conceito de faturamento. Naquela ocasião, optou-se pelo conceito empregado pela legislação que antecedeu a Lei nº 9.718/98 (Lei Complementar nº 70/91 e Medida Provisória nº 1.212/95), segundo a qual, o faturamento deve ser compreendido como a receita bruta das vendas e serviços, que compreende: (a) o produto da venda de bens nas operações de conta própria, (b) o preço dos serviços prestados e (c) o resultado auferido nas operações de conta alheia (aqueles obtidos pela venda de produtos ou mercadorias pertencentes a terceiros, mediante o pagamento de uma comissão), a teor do disposto nos arts. 279 do decreto nº 3.000/99 - RIR, 44 da Lei nº 4.506/64 e 12 do decreto-Lei nº 1.598/77.
Por fim, quanto ao terceiro argumento, a Constituição Federal pode utilizar sinônimos, o que não quer significar que anule o sentido de uma das expressões utilizadas. Além disso, o § 8º do art. 195 refere-se à contribuição do segurado, o que apenas quer significar que a CF fixou de modo mais rígido a forma de contribuição, com isso, ela não limitou a competência concedida no inciso I do mesmo artigo.
O Supremo Tribunal Federal, na realidade, acolheu o argumento de que apenas após a EC nº. 20/98 é que, por meio de Lei Complementar, poder-se-ia instituir a contribuição ora impugnada, uma vez que tal modalidade de incidência tributária configura uma nova fonte de custeio da seguridade social.
A configuração de uma nova fonte de custeio da seguridade social por lei ordinária, sem fundamento na redação original do art. 195 da Constituição, foi reiterada nos votos dos Ministros Eros Grau, Cezar Peluso. Os demais Ministros que proferiram votos escritos sobre o mérito, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia, também indicaram a ofensa à reserva de lei complementar.
3.2. Convalidação da cobrança pela Lei 10.256/2001
Ocorre que, em 2001, foi publicada a Lei n.º 10.256, que alterou o art. 25, dizendo:
Art. 1º A Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, passa a vigorar com as seguintes alterações:
'Art. 25. A contribuição do empregador rural pessoa física, em substituição à contribuição de que tratam os incisos I e II do art. 22, e a do segurado especial, referidos, respectivamente, na alínea a do inciso V e no inciso VII do art. 12 desta Lei, destinada à Seguridade Social, é de:
.....................................................................
§ 9º (VETADO)
'Art. 25A. Equipara-se ao empregador rural pessoa física o consórcio simplificado de produtores rurais, formado pela união de produtores rurais pessoas físicas, que outorgar a um deles poderes para contratar, gerir e demitir trabalhadores para prestação de serviços, exclusivamente, aos seus integrantes, mediante documento registrado em cartório de títulos e documentos.
§ 1º O documento de que trata o caput deverá conter a identificação de cada produtor, seu endereço pessoal e o de sua propriedade rural, bem como o respectivo registro no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA ou informações relativas a parceria, arrendamento ou equivalente e a matrícula no Instituto Nacional do Seguro Social - INSS de cada um dos produtores rurais.
§ 2º O consórcio deverá ser matriculado no INSS em nome do empregador a quem hajam sido outorgados os poderes, na forma do regulamento.
§ 3º Os produtores rurais integrantes do consórcio de que trata o caput serão responsáveis solidários em relação às obrigações previdenciárias.
§ 4º (VETADO)'
(...)
Art. 2º A Lei no 8.870, de 15 de abril de 1994, passa a vigorar com as seguintes alterações:
'Art. 25. A contribuição devida à seguridade social pelo empregador, pessoa jurídica, que se dedique à produção rural, em substituição à prevista nos incisos I e II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, passa a ser a seguinte:
.....................................................................
§ 1º O disposto no inciso I do art. 3o da Lei no 8.315, de 23 de dezembro de 1991, não se aplica ao empregador de que trata este artigo, que contribuirá com o adicional de zero vírgula vinte e cinco por cento da receita bruta proveniente da venda de mercadorias de produção própria, destinado ao Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR).
.....................................................................
§ 3º (VETADO)
.....................................................................
§ 5º O disposto neste artigo não se aplica às operações relativas à prestação de serviços a terceiros, cujas contribuições previdenciárias continuam sendo devidas na forma do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991.' (NR)
'Art. 25A. As contribuições de que tratam os incisos I e II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, serão devidas pelos cooperados, na forma do art. 25 desta Lei, se pessoa jurídica, e do art. 25 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, se pessoa física, quando a cooperativa de produção rural contratar pessoal, exclusivamente, para colheita de produção de seus cooperados.
§ 1º Os encargos decorrentes da contratação de que trata o caput serão apurados separadamente dos relativos aos empregados regulares da cooperativa, discriminadamente por cooperados, na forma do regulamento.
§ 2º A cooperativa de que trata o caput é diretamente responsável pelo recolhimento da contribuição previdenciária de que trata o art. 20 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991.
§ 3º Não se aplica o disposto no § 9o do art. 25 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, à contratação realizada na forma deste artigo.'
Art. 3º O art. 6o da Lei no 9.528, de 10 de dezembro de 1997, passa a vigorar com a seguinte redação:
'Art. 6º A contribuição do empregador rural pessoa física e a do segurado especial, referidos, respectivamente, na alínea a do inciso V e no inciso VII do art. 12 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, para o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR), criado pela Lei no 8.315, de 23 de dezembro de 1991, é de zero vírgula dois por cento, incidente sobre a receita bruta proveniente da comercialização de sua produção rural.' (NR)
Art. 4º A alínea f do § 1o do art. 3o da Lei no 9.317, de 5 de dezembro de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação:
'Art. 3º .....................................................................
§ 1º .....................................................................
.....................................................................
f) Contribuições para a Seguridade Social, a cargo da pessoa jurídica, de que tratam a Lei Complementar no 84, de 18 de janeiro de 1996, os arts. 22 e 22A da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991 e o art. 25 da Lei no 8.870, de 15 de abril de 1994.
.....................................................................' (NR)
Art. 5º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação produzindo efeitos, quanto ao disposto no art. 22-A da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, com a redação dada por esta Lei, a partir do dia 1o (primeiro) do mês seguinte ao 90o (nonagésimo) dia daquela publicação, sendo mantida, até essa data, a obrigatoriedade dos recolhimentos praticados na forma da legislação anterior. (Redação dada pela Lei nº 10.993, de 2004)
Art. 6º Ficam revogados o § 5o do art. 22, os §§ 6o, 7o e 8o do art. 25 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, e o § 2o do art. 25 da Lei no 8.870, de 15 de abril de 1994.
A 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu que a Lei 10.256/01 seria fundamento suficiente para se reconhecer a constitucionalidade da cobrança da Contribuição denominada Funrural (Apelação Cível n.º 0002422-12.2009.404.7104, Relatora Maria de Fátima Freitas Labarrère, D.E. 11/05/2010). Esse entendimento, contudo, já foi suplantado por recente decisão da Corte Especial do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, como exemplifica a ementa abaixo:
AGRAVO. SUSPENSÃO DE SENTENÇA EM MANDADO DE SEGURANÇA. GRAVE LESÃO AOS BENS TUTELADOS PELO ART. 15º DA LEI 12.016/09. FUNRURAL. ART. 25 DA LEI Nº 8.212/91. EXISTÊNCIA DE PRECEDENTES RELEVANTES EM FAVOR DA TESE DEFENDIDA PELOS CONTRIBUINTES. AGRAVO PROVIDO PARA INDEFERIR O PEDIDO DE SUSPENSÃO.
A suspensão de ato judicial é dirigida à Presidência dos tribunais e está respaldada no que dispõem as Leis nºs 12.016/09, 8.437/92 e 9.494/97, que tratam da suspensão da execução da decisão concessiva de liminar, de segurança definitiva não transitada em julgado, ou de tutela antecipada.
O pressuposto fundamental para a concessão da medida suspensiva é a preservação do interesse público diante de ameaça de lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. É deferida nos casos em que determinado direito judicialmente reconhecido pode ter seu exercício suspenso para submeter-se, mesmo que temporariamente, ao interesse público e evitar que grave dano aos bens legalmente tutelados venha a ocorrer.
O STF reconheceu a inconstitucionalidade da contribuição prevista no art. 25 da Lei nº 8.212/91 no julgamento do RE nº 363.852/MG já levando em consideração a existência da Lei nº 10.256/01. E mais, as Turmas que detém competência em matéria tributária albergam esse entendimento e têm decidido a questão em favor da tese defendida pelos contribuintes.
Considerando os relevantes precedentes a respeito do mérito debatido na ação originária, entendo que os argumentos formulados na decisão monocrática, no sentido de demonstrar grave risco de lesão à ordem pública caso seja colocada em prática a decisão proferida pelo juízo de primeiro grau, não mais prevalecem, sendo substanciais o bastante para que se dê provimento a este agravo, pois o risco de lesão ao erário resta esvaziado na medida em que a legalidade da exação debatida nos autos originários não encontra respaldo na jurisprudência pátria. (AGRAVO (INOMINADO, LEGAL) EM SUEXSE Nº 0025870-49.2010.404.0000/PR, REL. Vilson Darós, julgado em 28/10/2010).
Com efeito, a redação estabelecida pela Lei n.º 10.256/2001 não é suficiente para a cobrança do tributo. Nela, não estão estabelecidas a base de cálculo nem as alíquotas.
Ainda que se questione a decisão do Supremo em alguns pontos, ela detém um único argumento pela inconstitucionalidade, cuja refutabilidade é bastante reduzida. Trata-se, como já disse, da base de cálculo eleita pela lei, que não corresponderia à faturamento mas à receita, conceito que não estava previsto na Constituição Federal antes de a EC n.º 20/98 alterar o art. 195.
A Lei 10.256/2001, cujos artigos que nos interessam foram transcritos acima, não alterou os incisos I e II do art. 25 da Lei n.º 8.212/91, os quais estabelecem a base de cálculo e a alíquota da contribuição declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, os quais ainda possuem a redação fixada pela Lei n.º 9.528/97.
Sozinha, a Lei 10.256/2001 é uma lei sem eficácia, porque mutilada. Sem a previsão de base de cálculo e de alíquotas, não pode ela pretender sustentar a exigibilidade de um tributo.
3.3. Reflexos da inconstitucionalidade da exação
Sendo afastada a contribuição substitutiva (art. 25 da Lei 8.212/91), é possível que o contribuinte, com base em entendimento do Fisco, possa ser compelido ao pagamento da contribuição substituída (art. 22, I e II, da Lei 8.212/91).
Embora tal questão não seja, propriamente, objeto do presente processo, a declaração de inconstitucionalidade tem como um dos efeitos o restabelecimento da legislação revogada, no caso a redação original da Lei n. 8.212/91, que determina que todos os empregadores, sem distinção, devem recolher suas contribuições previdenciárias tomando-se como base de cálculo a sua folha de salários, à alíquota de 20%. Portanto, decisão do STF poderá, a depender do caso, extremar a carga tributária do empregador rural.
Vale mencionar, no sentido do texto acima, voto proferido na ADIn 652-5-MA , pelo Min. Celso de Mello:
'A declaração de inconstitucionalidade de uma lei alcança, inclusive, os atos pretéritos com base nela praticados, eis que o reconhecimento desse supremo vício jurídico, que inquina de total nulidade os atos emanados do Poder Público, desampara as situações constituídas sob sua égide e inibe - ante a sua inaptidão para produzir efeitos jurídicos válidos - a possibilidade de invocação de qualquer direito. - A declaração de inconstitucionalidade em tese encerra um juízo de exclusão, que, fundado numa competência de rejeição deferida ao Supremo Tribunal Federal, consiste em remover do ordenamento positivo a manifestação estatal inválida e desconforme ao modelo plasmado na Carta Política, com todas as conseqüências daí decorrentes, inclusive a plena restauração de eficácia das leis e das normas afetadas pelo ato declarado inconstitucional' (STF - Pleno, Ac. un. ADIn 652-5-MA - Questão de Ordem - Rel. Min. Celso de Mello, DJU de 02.04.93, p. 5.615).
Assim, aplicar-se-ia a Lei n.º 9.868/99, ainda que o controle de constitucionalidade efetuado, no presente caso, tenha ocorrido no plano difuso, sem eficácia erga omnes. Deve se considerar, ainda assim, que nada justifica a aplicação de tratamento legal diverso em relação à inconstitucionalidade inter partes:
Art. 11. (...) § 2o A concessão da medida cautelar torna aplicável a legislação anterior acaso existente, salvo expressa manifestação em sentido contrário.
3.4. Restituição ou compensação
Na hipótese de substituídos, integrantes da categoria profissional abrangida pela federação sindical e que ostentam a condição de pessoas físicas empregadoras rurais, terem recolhido valores indevidos, deverá a União restituí-los.
Ressalto, todavia, que a execução do julgado deverá ser empreendida individualmente por cada um dos membros da categoria abrangida pela federação sindical (empregadores rurais pessoa física, que deverão demonstrar tal condição).
Destarte, após o trânsito em julgado desta decisão (CTN, art. 170-A), poderão os substituídos buscar a compensação de eventual indébito tributário, nos termos do art. 66 da Lei 8.383/91.
Anoto que o valor a ser restituído ou compensado será acrescido de juros obtidos pela aplicação da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC para títulos federais, acumulada mensalmente, a partir do mês subsequente ao do pagamento indevido ou a maior que o devido até o mês anterior ao da compensação ou restituição e de 1% (um por cento) relativamente ao mês em que estiver sendo efetuada (art. 89, § 4º, da Lei nº 8.212/91).
3.5. Do pedido de depósito
Mantenho integralmente o entendimento adotado no momento de exame do pedido de depósito judicial:
A contribuição de que trata o feito está sujeita ao regime de substituição tributária, sendo certo que a retenção do tributo compete ao adquirente da produção rural (responsável tributário).
Destarte, o contribuinte não possui disponibilidade sobre referidos valores, assim como não existe direito subjetivo ao depósito, dependendo, a medida, de autorização judicial. O deferimento do pedido de depósito, nessa hipótese, depende da análise do caso concreto e de suas peculiaridades.
In casu, não constato a viabilidade da medida requerida, porquanto a determinação judicial se daria em face de terceiro, futuro e incerto, quais sejam os eventuais adquirentes da produção rural dos substituídos, ora autores. Consoante já decidido pelo STJ, o depósito pressupõe voluntariedade do contribuinte e não imposição a terceiros. Colaciono o precedente a que se faz referência:
TRIBUTÁRIO - FUNRURAL - SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA - DEPÓSITO POR RETENÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - REsp 654.038/RS - ACÓRDÃO - OMISSÃO - CONTRADIÇÃO - OBSCURIDADE - INEXISTÊNCIA.
1. Embora seja faculdade do devedor a realização do depósito judicial, não há mesma faculdade no chamado depósito por retenção, que consiste em determinação judicial para que o substituto tributário efetue o depósito em ação judicial movida por terceiro.
2. A substituição tributária visa otimizar a arrecadação e a fiscalização tributária e esta finalidade restaria prejudicada pela sistemática do depósito por retenção, passível de vários inconvenientes operacionais diante da incerta quantidade de substitutos (adquirentes da produção rural).
3. O depósito judicial pressupõe voluntariedade do devedor e não imposição a terceiros.
4. Não ocorre ofensa ao art. 535, II, do CPC, se o Tribunal de origem decide, de forma coerente e fundamentada, as questões essenciais ao julgamento da lide.
5. Inexistência de requisitos para a concessão de tutela antecipada em grau de recurso.
6. Recurso especial não provido.
(REsp 1158726/DF, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/03/2010, DJe 22/03/2010)(Grifei)
Com efeito, a operacionalização do depósito mostra-se extremamente difícil e com possibilidade de gerar consequências indesejáveis, como, por exemplo, na hipótese em que o substituído efetuar depósito a menor da contribuição ou de forma intempestiva.
Além disso, eventual julgamento de procedência do pedido garantirá a restituição dos valores recolhidos, com a devida correção.
Ante o exposto, INDEFIRO o pedido de antecipação da tutela.
III - Dispositivo
Ante o exposto, pronuncio a prescrição das parcelas anteriores a junho de 2005 e, no mérito, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, nos termos do art. 269, I, do Código de Processo Civil, para:
(a) declarar o direito de os substituídos, pessoas físicas integrantes da categoria sindical abrangida pela Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul e que sejam empregadores rurais, não se submeterem à retenção e recolhimento das contribuições previstas nos artigos 25, I e II, da Lei 8.212/91;
(b) condenar a União a repetir os valores eventualmente recolhidos indevidamente, nos termos da fundamentação.
Condeno a União ao ressarcimento das custas e ao pagamento de honorários advocatícios em favor da parte autora, os quais arbitro em R$ 20.000,00 (vinte mil reais), com fundamento no art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil, observados os critérios fixados no § 3º do mesmo artigo.
Sentença não sujeita ao reexame necessário, nos termos do art. 475, § 3º, do Código de Processo Civil, tendo em vista a decisão proferida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE 363.852/MG e RE 596.177/RS.
Publique-se. Intimem-se.
Eventuais apelações interpostas pelas partes restarão recebidas no efeito devolutivo e suspensivo (art. 520, caput, do CPC), salvo nas hipóteses de intempestividade e, se for o caso, ausência de preparo, as quais serão oportunamente certificadas pela Secretaria.
Interposto(s) o(s) recurso(s), intime(m)-se a(s) parte(s) contrária(s) para apresentação de contra-razões. Decorrido os respectivos prazos, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Porto Alegre, 28 de novembro de 2011.
Elisângela Simon Caureo
Juíza Federal Substituta
Esta matéria foi colocada no ar originalmente em 18 de janeiro de 2012.
ISSN 1983-392X
Fonte: Migalhas
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