segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Enigma jurídico - Legislação trabalhista aplicada no campo é interpretativa e abre brechas para subjetividade

A legislação que é aplicada no meio rural para tipificar trabalho análogo à escravidão dá margem a interpretações, abrindo brechas para a subjetividade, sobretudo no que se refere à Norma Regulamentadora de Segurança e Saúde no Trabalho na Agricultura, mais conhecida como NR 31. Isso fica latente nas atividades do grupo móvel de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), onde o relatório do auditor fiscal do trabalho é soberano e por si só tem poder de emitir uma sentença, condenando o empregador de imediato na esfera administrativa, sem qualquer oportunidade de esclarecimento e defesa. Este foi o principal recado da palestra do advogado Sólon Cunha, sócio responsável pela área trabalhista do escritório Machado Meyer, durante o seminário “Aspectos jurídicos, riscos e financiamento do agro”, realizado no final de julho, em São Paulo (SP). Segundo Cunha, o problema é que, exceto no Código Penal, não existe legislação que defina objetivamente o que é trabalho análogo à escravidão. “Há uma ausência absoluta de um conceito sobre o que é trabalho escravo”, disse, acrescentando que “para tentar contornar isso, o executivo editou a Instrução Normativa 91 a fim de definir alguns parâmetros”. O primeiro problema, pontuou o especialista, é que ao ancorar a fiscalização num ato do executivo, o MTE está agindo errado, já que apenas uma lei pode dizer se algo é crime ou não. Além disso, há ainda o agravante, lembrou Cunha, de que a IN leva em conta a ocorrência das mais variadas situações para tipificar um trabalho como análogo à escravidão, como, por exemplo, jornada exaustiva. “Se fosse aplicada no meio urbano, muitos empregadores da cidade poderiam ser acusados de trabalho forçado.” “Existe muita ideologia envolvida nesta questão”, afirmou Elias Marques de Medeiros Neto, diretor jurídico da Cosan, também palestrante no seminário. Soma-se a isso, ressaltou, o fato de que há conflito entre o que diz o Código Penal e o que rege a fiscalização no campo. De acordo com o Medeiros Neto, um empregador pode ser sentenciado no âmbito administrativo – tendo inclusive seu nome incluído na lista do trabalho escravo –, mas não ser condenado com base no Código Penal. Para ele, há certa pirotecnia nas ações de fiscalização. “De fato, há excessos”, disse Cunha. Medeiros Neto chamou atenção ainda para o fato de que a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) – que propõe expropriação de terras nos casos de trabalho análogo à escravidão -, em trâmite no Congresso Nacional, concede ainda mais poderes ao auditor fiscal do trabalho. OIT e NR31 Em sua fala, o advogado do Machado Meyer frisou ainda que pela ótica da Organização Internacional do Trabalho (OIT) muitos casos tachados como trabalho análogo à escravidão não seriam. “A OIT não caracteriza algum desacordo com a legislação trabalhista como trabalho forçado.” Ao final, Cunha citou ainda itens da NR 31 que dão margem à interpretações, como, por exemplo, “disponibilizar água em quantidade suficiente nos locais de trabalho.” Um fiscal, explicou o advogado, pode entender que o estoque de água disponível é insuficiente e autuar o empregador por isso. Já outro tópico, disse Cunha, determina que o “estabelecimento rural deverá estar equipado com material necessário à prestação de primeiros socorros”. A questão, indaga o advogado, é que não há especificação de quais itens este “kit de primeiros socorros” precisa ter. ”O fiscal pode achar que falta algo e autuar.”

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Juiz homologa habilitação de casamento entre duas mulheres

O juiz Alexandre Guimarães Gavião Pinto, titular da Vara de Família, da Infância, da Juventude e do Idoso de Itaguaí, homologoua habilitação de um casamento homoafetivo firmado entre duas mulheres, moradoras da cidade. A decisão foi proferida no dia 24 de julho e permite as duas contrair matrimônio pelo regime de comunhão universal de bens, de acordo com o pacto antenupcial já lavrado no Ofício de Notas de Itaguaí. Segundo o juiz, a matéria é polêmica, mas deve ser tratada sob o ponto de vista jurídico, a fim de assegurar garantias e prerrogativas legítimas previstas na Constituição Federal a uma minoria que ao longo da história da humanidade vem lutando pela conquista de direitos. “Inicialmente, mister se faz salientar que, a ainda polêmica, para certa parcela da sociedade, questão relacionada aos direitos civis homoafetivos, não pode, em hipótese alguma, ser analisada e dirimida sob a ótica religiosa ou meramente superficial, profundamente maculada por preconceitos milenares e posturas marcantemente discriminatórias, que não mais se sustentam num moderno Estado Democrático de Direito”, afirmou o juiz. Ele disse também que os direitos humanos fundamentais são definidos como direitos e garantias do ser humano, que tem como escopo o direito a sua dignidade, por meio da proteção contra o arbítrio do poder estatal e o estabelecimento de condições mínimas de vida e desenvolvimento da personalidade humana. “A questão da possibilidade do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo se relaciona intimamente, não só com os direitos fundamentais acima tratados, mas também com os próprios direitos humanos”, ressaltou o magistrado. De acordo com ele, as uniões homoafetivas se enquadram no conceito de família conjugal traçado na Constituição Federal. “O amor existente numa família composta por consortes do mesmo sexo é tão relevante quanto o amor evidenciado numa família de consortes de sexo diverso, almejando, da mesma forma, o casal homoafetivo uma comunhão plena de vida e de destinos livremente escolhidos e trilhados em conjunto, de forma pública e solidária, continua e duradoura, o que revela que o hodierno conceito de família se baseia no amor incondicional e no louvável afeto que, aliado à publicidade, durabilidade e continuidade da união estabelecida, independe de o casal ser de sexos diferentes ou idênticos, até porque as famílias legitimamente formadas não podem mais ficar à margem da sociedade, com a exclusão dos direitos e legítimas prerrogativas de seus membros”, destacou. Na decisão, o juiz Alexandre Guimarães lembrou ainda que a ingerência do Estado na vida privada dos cidadãos é inconstitucional e desumana, “não podendo o direito ao casamento civil suportar restrições por parte do legislador ordinário, como já vem se posicionando, ainda que de maneira extremamente discreta, a jurisprudência pátria e os arestos dos tribunais superiores, o que inclui os Colendos Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal”. Fonte: TJRJ